Zizi Possi grava neste fim de semana, dias 17, 18 e 19 de agosto, seu novo CD e DVD que ganhou o nome de Tudo se transformou
e será dirigido pelo irmão da cantora, José Possi Neto. Os shows
acontecem na casa de shows Tom Jazz, mesmo local onde, em 2010, Zizi
gravou seu último trabalho, o DVD Cantos & contos, feito de maneira independente e lançado pela gravadora Biscoito Fino.
Sem ainda saber ao certo quando e por qual gravadora o novo álbum
chegará ao mercado, Zizi, que diz detestar a burocracia que envolve o
lançamento de um trabalho, prefere se concentrar no show e nas músicas
que vai apresentar ao público, muitas inéditas em sua voz, como a
composição ‘Sem Você’, parceria de Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown.
A cantora também vai apresentar uma compositora pouco conhecida do
grande público, a gaúcha Necka Ayala, de quem Zizi escolheu a canção “O
vento”. “Ela é uma grande poeta, de uma sensibilidade incrível. Hoje em
dia eu sinto falta de poesia na música, parece que isso acabou”, diz
Zizi.
Em conversa com ÉPOCA, Zizi revela algumas músicas que estarão no show,
fala de como as experiências que viveu transformaram seu canto e faz um
balanço sobre a iniciativa de ter produzido seu último trabalho.
“Fiquei com um rombo em minha conta bancária”, diz.
ÉPOCA - No projeto anterior, “Cantos & contos”, você mesma
arregaçou as mangas e produziu o trabalho. Esse novo DVD será nesse
esquema também?
Zizi Possi– Não. Será uma co-produção, uma parceria entre mim e o Tom Jazz (casa de show). Eu apresentei esse show por lá, eles gostaram e propuseram que eu o gravasse.
ÉPOCA – E você já sabe por qual gravadora sairá?
Zizi – Não sei (risos). Na verdade, do que precisamos
é de uma boa distribuidora. Gravadora é bacana ter antes de fazer o
projeto, para poder arcar com os custos, com ensaios, com os trâmites
burocráticos. Mas, como somos nós que estamos cuidando de toda essa
parte, precisamos é de alguém que distribua. Vou te confessar uma coisa:
nestes anos todos de estrada, descobri que sou uma ótima cantora, mas
uma péssima administradora. Eu me coloquei no mercado de um jeito
bacana, sou respeitada, mas, para essa parte de administração, eu não
tenho mais idade (risos). É muita coisa complicada! Eu prefiro fazer um projeto de arquitetura a ter que lidar com essa parte burocrática.
ÉPOCA – Prefere pensar só no show, em cantar?
Zizi – Pois é. Olha que privilégio! Viajar em música, em tudo que envolve o show.
ÉPOCA - E qual o balanço que você faz do projeto Cantos & contos, que você produziu?
Zizi – Da parte artística e profissional foi genial. Sinto-me
muito mais segura, muito mais madura. Eu e a minha banda criamos uma
linguagem importante, nos comunicamos pelos olhos. Criamos uma prática
de improvisos a que eu sempre fui meio arredia, sempre gostei de ensaiar
meus improvisos. Ficamos mais corajosos, confiando mais em nosso
próprio taco. Mas, do ponto de vista financeiro, esquece. Foi um rombo
na minha conta pessoal. Embora tenha sido legal, porque, sem divulgação
nenhuma, sem ação de rádio, vendi cerca de 10 ou 11 mil DVDs, o que é
uma marca muito bacana.
ÉPOCA - Muitos outros artistas criaram seus selos para lançar
seus trabalhos, como Djavan, Zé Ramalho, Pedro Mariano. Você que acha,
de certa forma, vocês demoraram em partir por esse caminho mais
independente?
Zizi – Sabe o que é? Quando existiam gravadoras fortes, elas
tinham um monte de defeitos. Mas era muito legal ter uma grana lá todo
ano para fazer seus projetos. Grana para produzir o CD, para pagar
estúdio para ensaiar. Elas davam apoio em todas as etapas. Mas nós
perdemos isso. Atualmente, as gravadoras só querem investir no que vende
muito, no que dá retorno rápido. Hoje não tem mais nem quase lojas de
discos. Todo mundo está tendo que se reinventar. Temos que usar a
internet, não só para sermos pirateados, mas para vendermos nosso
trabalho.
ÉPOCA - O nome do show (Tudo se transformou) é o nome do samba de Paulinho da Viola. É um samba um tanto triste, apesar de bonito. Por que o escolheu como título do show?
Zizi – Na verdade, ele é triste do ponto de visto da perda,
mas não da vida. A vida é feita de perdas, não? E “tudo se transformou”
tem a ver com o meu momento de vida. A vida é transformação, a mudança é
regra. Esse título tem a ver com o conteúdo do show, da maneira como eu
estou cantando, com o subsídio que eu tenho para cantar dessa forma.
ÉPOCA – De que maneira seu canto se transformou?
Zizi – Na verdade, não é o canto que se transforma, é a
consciência. É o jeito de olhar, de achar a informação. Quem passa o que
eu passei (Zizi teve sérios problemas de coluna e chegou a ficar três meses na cama)
não sai impune. Mas também acredito que não seja preciso passar pelo o
que eu passei para se transformar. Basta viver. A gente está aqui para
isso.
ÉPOCA - Você vai gravar canções inéditas?
Zizi – Vou cantar canções que são inéditas na minha voz, como
uma música inédita chamada “O vento”, de uma compositora gaúcha, Necka
Ayla. Ela tem o trabalho mais bonito de poesia, de melodia e harmonia
que eu ouvi nos últimos tempos. Necka é uma grande poeta, de uma
sensibilidade incrível. Hoje em dia eu sinto falta de poesia na música,
parece que isso acabou.
ÉPOCA – Como você a encontrou?
Zizi – Ela me mandou um CD com músicas dela há algum tempo.
Muitos compositores me mandam. Mas ouvir música para mim é coisa
sagrada. Eu tenho que parar tudo e me dedicar àquilo. Por isso, às vezes
demoro anos para ouvir, mas ouço.
ÉPOCA – Outra que está no roteiro é Meu mundo e nada mais, sucesso do Guilherme Arantes...
Zizi - Sim, que aconteceu na minha vida por causa da Marina e
do DJ Zé Pedro, que me convidaram para gravá-la em um disco em homenagem
ao Guilherme (A voz da mulher na obra de Guilherme Arantes). Tem também “Porta Estandarte”, do Geraldo Vandré, que eu canto em shows, mas nunca gravei.
ÉPOCA – E aquela da “Xô, celulite”? Também estará no show?
Zizi – (risos) Aquilo é uma brincadeira! Faz tempo que eu não a canto, aliás. Na época que eu a fiz, deu até Fantástico.
Fizeram uma matéria sobre celulite e vieram me entrevistar. As pessoas
pediam no show e eu cantava. Mas ela não cabe no roteiro desse novo
show. Só se a pedirem muito mesmo...
ÉPOCA – Você falou dessa nova compositora gaúcha, de quem vai gravar uma música. O que mais te chama atenção na música atual?
Zizi – O que me chama a atenção, sinceramente, é a falta de
poesia nas músicas, da qualidade dos versos. Eu fico pas-sa-da! Meu Deus
do céu! Em um país que tem Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque,
Gonzaguinha, Renato Russo, Arnaldo Antunes... O que está acontecendo?
Cadê todo mundo? Não sei se isso é fruto da modernidade, falta de
qualidade, de educação, um conflito de gerações...
ÉPOCA – Isso dificulta encontrar canções?
Zizi – Claro. Rádio eu ouço pouco, só quando estou dirigindo.
Às vezes ouço uma ou outra canção em novelas. Mas não acho que tenha
nada muito novo por aí não...
ÉPOCA - Está na moda artistas recriarem algum show ou tocarem
um disco na íntegra no palco. Tem vontade de fazer algo desse tipo com
algum trabalho seu?
Zizi – Eu não. Para mim, show é show, disco é disco. Eu tenho
vontade de fazer um trabalho, que está na minha imaginação faz tempo,
que é mais existencialista, com músicas e instrumentos que a gente não
usa normalmente, uma coisa mais em 4-D. Só que preciso de grana. Posso
até aprová-lo na Lei Rouanet (de incentivo à cultura), mas conseguir a grana mesmo, quero ver...
ÉPOCA - Recentemente, o Canal Viva reprisou, com muito sucesso, o programa Globo de Ouro. Você apareceu diversas vezes cantando “A paz”. Sente saudades dessa época?
Zizi – Eu sinto. Sinto saudades da época em que a música era
importante na vida das pessoas a ponto de ter um mercado, de ter
programas na televisão para música. Eu tenho uma profissão que perdeu
status na mídia, no mercado. E o pouco espaço que sobrou é disputado a
tapa por quem vende mais. Esse esvaziamento me entristece.
ÉPOCA - Parecia uma época, nas rádios e nas TVs, mais aberta para a diversidade da música...
Zizi – Tinha espaço para todo mundo, para todo tipo de música.
Isso que é riqueza cultural. A gente começa a empobrecer quando só há
um caminho, só uma ou duas opções, no máximo. Riqueza cultural é ter um
leque aberto. Nos últimos anos tudo foi se estreitando, baseado no que é
popular. Mas nem fico pensando muito nisso, senão eu piro. Prefiro
pensar em música que é bem melhor.
ÉPOCA - Por falar nos anos 80, é verdade que a música “Perigo” você não canta mais? Por quê?
Zizi – Não! Ás vezes canto sim, inclusive à capela. É o maior
barato, todo mundo cantando comigo. Essa música é muito legal, uma
cantada gay (risos). Hoje, talvez, eu não a escolhesse para
gravar, porque eu estou em um outro momento de vida, tenho outra cabeça.
Ela não faz parte do meu momento, não estou naquela fase mais, não que
isso invalide tudo que passou, afinal foi o que me trouxe até aqui. Mas
teria que cantá-la pensando naquela fase, lá atrás... Só mexeria no
arranjo, daria palpite, coisa que eu não fazia antes.
Fonte: Revista Época