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domingo, 17 de fevereiro de 2013

POLÊMICAS NA INDUSTRIA DO CARNAVAL DA BAHIA - Blocos vendem vagas no circuito Barra-Ondina por até R$ 500 mil; MP abre investigação

Donos de espaços privilegiados no circuito da orla vendem lugar na fila dos desfiles de Carnaval, mesmo não tendo mais ligações com a festa. Para 2014, prefeitura promete mudar regra da ordem das apresentações


Na última vez que o bloco Gula desfilou no Carnaval de Salvador com seu nome, em 2007, a banda Terra Samba, que estava no auge do sucesso, foi a atração principal. De lá pra cá, especialistas em Carnaval afirmam que o bloco só aluga vagas para artistas que querem desfilar no seu horário, um dos primeiros do Circuito Dodô (Barra-Ondina).
Virou um bloco de aluguel - como pelo menos outros cinco que deveriam desfilar no circuito, mas apenas negociam sua vaga na fila com grande nomes do Carnaval baiano.
Esse comércio de vagas, distribuídas oficialmente por critério de antiguidade, está na mira da prefeitura de Salvador e do Ministério Público. É um negócio cada vez mais lucrativo.
O bloco Camaleão, da banda Chiclete com Banana, por exemplo, desfila no horário do Gula na Barra desde 2008 pagando a cifra de R$ 500 mil por dia, segundo fonte ligada ao próprio bloco. 
Além do Camaleão, já saíram nas vagas do Gula blocos de Claudia Leitte (2008, 2009 e 2010), Jammil (2010) e  Cheiro de Amor (2011 e 2013).
Um empresário que já comprou uma vaga do bloco Gula afirma que os detentores da  posição não fazem Carnaval há muito tempo. “Um dos donos da vaga é bancário em São Paulo e não faz Carnaval há anos”, conta. O cantor Bell Marques, sócio do bloco Camaleão, foi procurado para comentar o assunto, mas não foi localizado.
Já Reinaldo Cerqueira, que é sócio da banda Chiclete com Banana, defende o comércio das vagas. “Eu acho que o que tem que se entender é que o Carnaval da Bahia é feito pela iniciativa privada. Quando se coloca um bloco na rua, há um risco, e tem que se vender o bloco. Se a pessoa tem o direito adquirido da vaga, nada mais justo que ela faça negócio”, argumenta.
Polêmica
No Carnaval deste ano, o comércio de posição na fila foi parar na Justiça e quase o bloco Largadinho, de Claudia Leitte, não desfila. Como seu bloco é novo, ela comprou o espaço na Barra do Broder por R$ 100 mil, mas o lugar já tinha sido vendido para a Timbalada. 

A promotora do Ministério Público estadual Rita Tourinho, que está analisando a questão, explica que, para camuflar a venda do espaço na fila, é comum que os blocos façam falsas parcerias. “Eles dizem que fazem parceria, mas há indícios de vendas das vagas, o que é ilegal e contra o regulamento do Conselho do Carnaval de Salvador. Eles camuflam isso na hora de colocar o bloco na rua. Até os abadás que são vendidos saem com os nomes dos dois blocos escritos”, explica a promotora.
O indício do negócio pode ser detectado na programação do Carnaval quando os blocos saem com dois nomes. Foi o caso dos blocos puxados, este ano, pelas bandas Aviões do Forró e Filhos de Jorge.
O empresário dos grupos, Vagner Miau, admite que alugou vagas do bloco Fissura para as duas bandas saírem na Barra. Apesar de não revelar o valor pago, Miau diz que o preço sobe para bandas novas.
“Como é de praxe, todo mundo que é mais antigo no circuito acaba negociando as vagas que possui. Não tem um valor, depende do artista. As bandas mais novas, como é o caso da Filhos de Jorge, precisam aparecer na mídia e acabam pagando mais”, conta.
Miau disse que, por razões contratuais, não poderia falar sobre os valores negociados para os desfiles. “Sempre ouvi falar de R$ 100 mil a vaga. Nunca valores acima”, afirmou o empresário.
O empresário da banda Cheiro de Amor, Windson Silva, se diz radicalmente contra a venda e acredita em novas medidas para facilitar a ordem dos desfiles. Apesar disso, compra, desde 2011, vaga para o bloco Cheiro desfilar na terça-feira na Barra, mesmo tendo horário privilegiado no Campo Grande no mesmo dia, por conta da antiguidade do bloco naquele circuito.
“Tudo tem um contrato com cláusulas de sigilo. Não posso falar, mas para bom entendedor meia palavra basta”, disse o empresário da Cheiro de Amor, ao ser questionado sobre o suposto valor de R$ 200 mil pago para os donos do bloco Gula pela vaga na Barra.
Parcerias 
O cantor Pablo do Arrocha desfilou em horários nobres do circuito, o que acabou colocando ele entre os 10 artistas mais vistos da folia. O empresário de Pablo, Josué Assis, alega que não comprou a vaga no circuito, mas que fez parceria com bloco Alô Inter.

“É uma vaga do Alô Inter que ano passado saiu com Netinho. Este ano eles me chamaram para fazer uma parceria. As pessoas procuram o horário que dê visibilidade. Dividimos custos e porcentagem nas vendas”, explica Assis.

O dono da vaga do Alô Inter na Barra é Frederico Cruz Dalcon. “Nunca vendi e acho imoral a venda de espaço. O critério de antiguidade tem que ser respeitado e, mais do que isso, tem que ser respeitado quem faz Carnaval. Sou contra essa prática de venda de espaço”, concluiu.

Conselho do Carnaval quer vetar fusões
O presidente do Conselho do Carnaval, Pedro Costa, indica que para 2014 as fusões de blocos podem ser vetadas pelo conselho, para evitar a camuflagem de venda de espaço na fila. “Se as entidades nos apresentam contratos de fusões, temos que acreditar que é isso e não uma venda de espaço. Se existe alguma entidade que faz esse tipo de prática, será expulsa pelo conselho de ética”, diz.

O secretário de Desenvolvimento, Cultura e Turismo de Salvador, Guilherme Bellintani, informa que nos próximos 10 dias deverá diagnosticar todos os blocos de aluguel.  “Os que estão vendendo ou alugando e não podem desfilar. Eu não quero saber quanto custa uma vaga. Quero é acabar com isso”.
MP abre apuração sobre ordem dos desfiles na Barra
Blocos como Fissura, Gula, Fecundança e Broder estão na mira da promotora Rita Tourinho, sob suspeita de que usam o benefício do lugar na fila para vender os espaços, como fez o ex-jogador Edilson Ferreira, o Capetinha. Segundo sua esposa e sócia, Ivana Solon, ele vendeu o mesmo espaço para o bloco Largadinho, de Cláudia Leitte, e para a Timbalada. 

A promotora solicitou, sexta-feira, ao Conselho do Carnaval uma lista dos donos dos blocos e ordem de desfile este ano. “Vamos apurar todos os casos, principalmente os que são mostrados com fusões, mas que têm indícios de venda”.
Segundo o secretário Guilherme Bellintani, o Broder já está excluído do próximo Carnaval. Outros quatro blocos, que o gestor não quis identificar, também perderão o lugar por não terem desfilado com trios este ano.
O presidente do Conselho do Carnaval, Pedro Costa, afirma que os critérios para 2014 devem ser analisados com cuidado. “Não é justo que os primeiros blocos a descer para a Barra, quando ninguém queria desfilar nesse circuito, sejam penalizados”.


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